Diogo
Lisboa
Noite
O concerto nem acabou muito tarde, mas parecia que Lisboa já tinha fechado a loja há muito tempo. Com tempos de espera entre 15 a 20 minutos no Metro, muitos decidiram ir a pé ou chamar um Uber.
Lisboa
Noite
O concerto nem acabou muito tarde, mas parecia que Lisboa já tinha fechado a loja há muito tempo. Com tempos de espera entre 15 a 20 minutos no Metro, muitos decidiram ir a pé ou chamar um Uber.
O Diogo esbarrou contra a miúda da pedra quando estes estavam demasiado ocupados com os ecrãs do telemóvel para verem o caminho. Um sorriso sacana surgiu na cara da moça: uma pedra e uma carga de ombro.
“Ei, já é a segunda vez!” Ele riu-se. “Ainda me dói.” Ela respondeu com um beicinho. O rapaz olhou rapidamente para o ecrã e voltou-se para a rapariga quando esta se afastou.
"Simpática...” Mesmo de costas, reparou que as expressões da miúda pareciam tensas como se estivesse chateada com alguma coisa. Aproximou-se lentamente.
“Está tudo bem?” A cara com que ela “respondeu” não era de grandes amigos, mas esticou-lhe o telemóvel desligado e ele percebeu logo que o problema dela era outro: não tinha bateria.
“Precisas de ligar a alguém?” Ela sacudiu a cabeça. “Uber?” E acenou que sim. “Hmm. Tenho de cancelar o meu para mandar vir o teu.” Ele queria ajudar, a sério que queria, mas também se queria despachar e sair da rua. Ele já não tinha barcos para voltar à outra margem e um amigo estava à espera dele para o acolher. Seria, bem, rude se o fizesse esperar quando lhe estavam a fazer um alto favor. Ao mesmo tempo, a rapariga parecia aflita...
“OK...” abriu a luz do ecrã e cancelou a viagem. Há alturas na vida em que temos de nos chegar à frente para sermos o herói da nossa narrativa. Não precisamos de fatos justos, capas, voar ou derrotar gigantes, basta sacrificar uma viagem de Uber, chatear o condutor e deixar outra pessoa usar o nosso telemóvel.
E se ela podia mostrar gratidão? Podia, mas não seria a mesma coisa. Então, ela roubou-lhe o telemóvel da mão e pediu uma nova viagem. Foi quando reparou no wallpaper. Apontou para ele quando devolveu o telemóvel.
“Yeah, Final Fantasy. Conheces?” Ela acenou que sim. “Qual é o teu favorito?” Ela esticou nove dedos. “Prefiro o VI! De longe!” Uma sombra de um sorriso passou pelos lábios.
Cinco minutos para o carro chegar.
“Não falas muito” comentou o Diogo. Ela sacudiu a cabeça. “Ou eu falo demais?” Ela repetiu. “Ah, óptimo. Mais aliviado.” Ele olhou para o mapa, ia para o Cais, e reparou que ela se aproximou com a mão aberta para o telemóvel.
“Está quase, não te preocupes.” Mas ela tirou-o na mesma. Abriu o Facebook.
“Então?!” Pesquisou por si mesma e enviou convite. Ele colou-se ao seu lado sem saber se havia de ficar chateado ou curioso por uma rapariga estar-se a adicionar no seu telemóvel.
Ela abriu o chat com ela mesmo e os dedos mexeram-se quase à velocidade da luz.
FIQUEI SEM BATERIA. OBRIGADO POR M EMPRESTARES O TLM
“Na boa...”
CHAMO-ME MARIANA E EU N FALO
“Diogo” respondeu. “E desculpa, não sabia que eras muda.”
N SOU MUDA. N TENHO SOM
Ele olhou-a com cara de parvo.
N CSG EXPLICAR. EU N TENH SOM
Ele não respondeu.
O ecrã mudou quando um número ligou. Ela esticou-lhe o telemóvel e ele foi obrigado a atender. O condutor estava encostado ao passeio do Metro, um pouco mais à frente, e para ela ir lá ter.
Ele transmitiu-lhe a mensagem e arrumou o telemóvel com um sentido de vitória vazio. Esticou a mão aberta para se despedir, mas ela passou por ele e caminhou em direcção ao carro. O Diogo recolheu os dedos um a um e lembrou-se que também tinha de mandar vir o seu. Nisto, uma mão enrolou-se ao braço e puxou-o. A Mariana estava a arrastá-lo em direcção ao Uber.
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